Como o tarifaço de Trump afeta decisões estratégicas em empresas brasileiras

A entrada em vigor do tarifaço de Trump, no dia 1º de agosto de 2025, ultrapassou as manchetes internacionais e atingiu em cheio o ambiente de negócios. As novas taxas sobre produtos importados, que chegam a 50% em alguns setores, colocaram empresas brasileiras de diferentes segmentos em estado de alerta.

Mesmo com exceções para itens como aeronaves, celulose e suco de laranja, por exemplo, mais de um terço das exportações brasileiras para os EUA foi diretamente impactado. Segundo o Governo Federal, cerca de 35,9% dessas exportações serão atingidas pelas novas tarifas, o que representa um risco direto para aproximadamente 10 mil empresas brasileiras, segundo dados da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham Brasil).

Continue a leitura para entender como o tarifaço de Trump afeta empresas brasileiras, mesmo aquelas que não vendem para os Estados Unidos e como transformar essa instabilidade em escolhas mais inteligentes.

Por que o tarifaço importa para empresas brasileiras?

Esse movimento tarifário dos EUA vem na esteira de uma nova onda protecionista que tem ganhado corpo no mundo pós pandemia. Acordos comerciais estão sendo renegociados com base em critérios ambientais, regionais ou de segurança nacional. Cadeias logísticas globais estão sendo revistas para reduzir dependências externas.

Com isso, empresas brasileiras precisam avaliar sua exposição indireta. Ou seja, mesmo que não exportem diretamente para os EUA, podem ser impactadas por oscilações no câmbio, aumento no custo de insumos e mudanças no comportamento de parceiros comerciais.

Nas palavras da advogada Anna Bastos, mentora nas áreas de Direito Internacional, Empresarial e Compliance e coordenadora da pós em Comércio Exterior e Internacionalização de Empresas do IPOG, “o comércio internacional hoje não é só sobre preços e produtos, é sobre diplomacia, estratégia e posicionamento global”. Isto é, estamos diante de uma nova geografia dos negócios, que exige das empresas, além da boa gestão, leitura de cenário, agilidade e capacidade de adaptação.

Conflitos geopolíticos e seus efeitos

Segundo a advogada e professora Anna Bastos, entre os principais reflexos dos conflitos geopolíticos, estão:

1- Interrupção de cadeias de suprimentos: conflitos armados ou disputas regionais podem bloquear rotas marítimas, afetar fábricas em regiões estratégicas ou dificultar o acesso a matérias-primas essenciais;

2- Sanções e barreiras comerciais: tensões como a guerra entre Rússia e Ucrânia ou os atritos entre EUA e China têm resultado em tarifas, embargos ou regras que afetam diretamente exportações e importações;

3- Redirecionamento de capitais internacionais: investidores tendem a evitar regiões instáveis e buscam ambientes com maior segurança jurídica e previsibilidade. Assim, empresas localizadas em países mais expostos a esses riscos podem perder competitividade ou acesso a recursos;

4- Reconfiguração de alianças econômicas: blocos e parcerias estão mudando. Países como Mali e Níger, por exemplo, vêm se afastando de parceiros tradicionais e se aproximando de novas potências, o que altera fluxos comerciais, prioridades de investimento e os próprios mapas de oportunidade.

Esse é o pano de fundo em que o tarifaço de Trump se insere: um mundo em transição, onde as rotas comerciais são redesenhadas em tempo real, os acordos são reescritos sob novas bases e as regras do jogo são cada vez mais ditadas por interesses estratégicos, não apenas por eficiência de mercado.

O que está em jogo nas decisões empresariais?

O primeiro impacto prático está nas decisões de médio e longo prazo. Empresas que planejam expansão, novos mercados ou mudanças logísticas precisam agora considerar:

  • Custos adicionais com insumos importados;
  • Mudança na demanda global por determinados produtos;
  • Aumento do risco-país em negociações internacionais.

Além disso, negócios que dependem de exportações precisam avaliar riscos regulatórios e a necessidade de diversificação de mercados. Com isso, fornecedores brasileiros começam a redirecionar seus esforços para outros mercados menos voláteis.

As principais lições que o tarifaço deixa

A principal lição que emerge do tarifaço é simples: a geopolítica precisa entrar na pauta das empresas.

Ignorar o contexto internacional, hoje, é tão arriscado quanto ignorar os concorrentes. Por isso, empresas bem-sucedidas costumam tomar decisões baseadas em três pilares principais, sendo eles:

  1. Análise de riscos políticos globais;
  2. Diversificação de fontes de receita e suprimento;
  3. Planejamento de cenários econômicos e cambiais.

Segundo Anna Bastos, “empresas que dominam esse cenário conseguem se antecipar a riscos, aproveitar janelas de oportunidade e redesenhar suas cadeias de valor de forma mais eficiente e rentável”.

Para isso, é fundamental olhar além do eixo EUA-Europa e ampliar o radar comercial para regiões como Oriente Médio, Sudeste Asiático e América Latina. Além de acordos regionais, zonas francas e hubs logísticos também surgem como alternativas viáveis para reduzir vulnerabilidades.

Decisões estratégicas sob novas incertezas

Como agir, então, diante desse novo cenário? Alguns passos práticos podem ajudar empresas a tomar decisões mais sólidas mesmo em um contexto de volatilidade:

1- Avaliar exposição indireta

Mesmo empresas que não exportam podem estar indiretamente expostas ao tarifaço. Se seus fornecedores forem impactados, os preços sobem. Se seus clientes forem afetados, a demanda muda. Portanto, mapear a cadeia de valor é essencial.

2- Redesenhar rotas e canais

A reorganização logística não se limita ao transporte. Ela envolve rever prioridades comerciais, atualizar contratos e buscar parceiros em regiões mais estáveis.

Essa talvez seja a mudança mais profunda. Acompanhar eventos internacionais deixou de ser uma curiosidade, tornou-se ferramenta de inteligência de mercado. Afinal, como mostrou o recente movimento dos EUA, uma decisão em Washington pode redesenhar o futuro do seu negócio aqui.

Ferramentas como o Trade Map, bases da OMC e da OCDE devem integrar as rotinas de planejamento estratégico, especialmente em empresas com qualquer tipo de operação internacionalizada.

De acordo com a professora Anna Bastos, “entender e monitorar o risco-país é essencial para decisões de exportação, importação, abertura de filiais no exterior ou mesmo captação de investimentos internacionais”.

Tarifas são apenas um dos muitos instrumentos usados por governos para proteger ou impulsionar seus setores estratégicos e sua adoção pode ser rápida, unilateral e com efeitos duradouros.

O futuro exige uma nova postura empresarial

Diante de um cenário global mais instável e sujeito a decisões políticas unilaterais, como o tarifaço de Trump, as empresas brasileiras precisam ir além da reação imediata. É essencial desenvolver cenários possíveis e respostas estruturadas para cada um deles, algo que envolve desde a escolha de onde instalar uma planta industrial até a redefinição de rotas logísticas e a antecipação de mudanças tarifárias em acordos multilaterais.

Essas decisões, no entanto, não podem mais ser guiadas apenas por projeções de mercado ou eficiência operacional. É preciso integrar variáveis geopolíticas à análise estratégica. O tarifaço evidenciou como fatores externos, muitas vezes fora do controle das empresas, têm potencial para redesenhar margens, prazos, contratos e modelos de negócio da noite para o dia.

Portanto, não basta acompanhar os desdobramentos globais, é preciso compreendê-los, traduzi-los em ação e incorporá-los à cultura decisória da empresa. Essa é a postura exigida de quem deseja atuar com resiliência e relevância nos próximos anos.

As empresas que sairão mais fortes desse contexto serão aquelas que souberem interpretar os sinais do ambiente internacional, antecipar movimentos e agir com consistência, inteligência e agilidade diante das transformações do mundo.

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