Que lição tiramos da greve dos caminhoneiros?
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Que lição tiramos da greve dos caminhoneiros?

greve de caminhoneiros

Segundo o professor Rafael Barros, coordenador do MBA em Engenharia Ferroviária do IPOG, é cada vez mais notório que a falta de investimento na infraestrutura brasileira poderá causar uma estagnação da economia brasileira a qualquer momento.

“Convivemos a cada dia mais com aumento das cargas tributárias, dívidas externas que não param de subir, inflação congelada e falta um programa de investimentos concreto do Governo Brasileiro que nos mostre uma “luz no fim do túnel” capaz de alavancar o nosso crescimento”, explica.

Tudo isso, segundo ele, se acentua quando analisamos os resultados imputados à nossa economia, no decorrer da greve dos caminhoneiros em todo os 26 estados brasileiros mais o DF.

Aqui no Blog IPOG nós já falamos sobre a importância das ferrovias para a economia de um país.

Os protestos causaram prejuízos de todos os tipos:

  • supermercados limitaram as vendas de produtos tidos como básicos
  • frotas de ônibus foram reduzidas ou até paralisadas
  • falta de combustíveis nos postos afetaram trabalhadores como taxistas e motoristas de aplicativos
  • preços dos alimentos dispararam em centros de distribuição como CEASA
  • impedimentos em passagens de níveis paralisaram a circulação ferroviária de carga (ex: Chapadão do Sul / MT).

Rafael Barros ainda acrescenta que como se todo este caos não bastasse, ainda temos que conviver com o medo por parte de muitos produtores que alertaram para risco de canibalismo em suas áreas de plantio.

Mas que lição podemos tirar da greve dos caminhoneiros?

“Em contrapartida, creio que este é o momento, aliás já passou de ser o momento ideal há tempos, para que o Governo Federal abra os cofres públicos para investimentos em infraestrutura ferroviária, através de muitos projetos engavetados por não saberem qual modelo de concessão será utilizado para licitar os projetos existentes.

Sem falar na grande sangria que precisa ser estancada de vez no país que diz respeito aos grandes desvios de verbas das obras públicas pelas empreiteiras, todas elas praticamente denunciadas na Lava Jato, para pagarem campanhas políticas”, alerta o coordenador.

Rafael acredita que 2018 será um ano crítico, por ser um ano eleitoral, e segundo ele, ano de muitas promessas políticas. “Porém nossos “governantes” precisam fazer sair do papel, com uma urgência incrível, projetos ferroviários de extrema importância para a manutenção do crescimento do país em consonância com a melhoria da nossa matriz de transporte, que encontra-se extremamente favorável ao modo rodoviário, como no quadro comparativo global citado abaixo:

Projetos ferroviários que merecem sair do papel

Os projetos ferroviários tidos como cruciais para a economia brasileira, na opinião de Rafael Barros, são os citados a seguir:

– Ferrogrão: ferrovia que liga a principal região agrícola do país aos portos da região Norte (Miritituba, Santarém e Vila do Conde), entre as cidades de Sinop/MT e Miritituba/PA, com 1.140 km de extensão e investimentos aproximados de R$ R$ 12 bilhões;

– Ferrovia de Integração Centro Oeste (FICO): ferrovia que servirá para escoamento da produção agrícola e agropecuária dos estados do MT e GO para os principais portos do país, Santos/SP e Paranaguá/SC, com 1.000 km de extensão e investimentos aproximados de R$ 10 bilhões.

– Ferrovia Norte Sul (Trecho Extremo Norte entre Açailândia/MA a Barcarena/PA com 477 km de extensão): ferrovia permitirá que as cargas da FNS entre Açailândia e Anápolis, com obras já concluídas, possam ser escodas pelo Porto de Vila do Conde/PA, criando mais uma rota de transporte ferroviário de cargas no país, desafogando os Portos da região Sul e Sudeste. O investimento inicial previsto em 2012 pelo Governo Federal foi de R$ 1,9 bilhões;

– Ferrovia de Integração Oeste Leste (FIOL): retomada em ritmo forte das obras já iniciadas desta ferrovia, cuja extensão é de 1.527 km entre o Porto de Ilhéus/BA e Figueirópolis/TO, divididos em três etapas, e com investimento total previsto de R$ 8,3 bilhões. Esta ferrovia servirá para escoamento de produtos como minério de ferro, soja, milho e açúcar, sendo tratada como uma alternativa para desafogar a entrada e saída de matéria prima vindas da América do Norte e da Europa.

Consequências ao investir nas ferrovias:

Se tratarmos apenas essas quatro principais obras, estamos falando em aumentar a nossa malha ferroviária em 4.144 km de extensão, e de uma forma estratégica, pois estaremos:

  • Atendendo os principais mercados produtores do Brasil na atualidade
  • Criando uma altíssima capacidade de exportação de nossa matéria prima com maior rapidez, segurança, uma vez que estaremos tirando um elevado número de carretas das estradas, que gerará uma diminuição do número de acidentes, e economia
  • Haverá um aumento no lucro de nossos produtores devido à grande economia de gastos com os valores dos fretes rodoviários.

Somado a todos os fatores citados acima, não podemos esquecer que uma infraestrutura fortalecida pelo transporte ferroviário, além de “desafogar” o país estrategicamente em vários indicadores, poderá contribuir muito com uma alavancagem da nossa economia, pois durante as obras teremos a criação de milhares de novos empregos diretos e indiretos, o que aumentará a arrecadação de um estado e país, bem como durante toda a manutenção da linha férrea, que será vitalícia, pois a mesma demandará por profissionais mais qualificados e técnicos. Como consequência vem a geração de mais investimentos em áreas como educação, seja a nível técnico como a nível superior.

“Apenas como um sinalizador de que a mentalidade do nosso Governo Federal é ultrapassada e precisa mudar, destaco que recentemente participei do 2º Congresso Anual Latino Americano sobre Expansão Ferroviária, na cidade de São Paulo/SP, e o que mais me chamou atenção foi que países como Argentina (29 novos projetos), Colômbia (7 novos projetos), Chile (5 novos projetos), México (10 novos projetos) e, para minha surpresa, países como Peru (9 projetos ) e Bolívia (2 projetos) lançaram seus projetos buscando parceiros estrangeiros, que possuem além de poder de investimento, expertise no assunto chamado ferrovia”, alerta o coordenador do MBA do IPOG..

A essa análise ele ainda acrescenta: “Enquanto aqui no Brasil evitamos a entrada de capital chinês, americano e russo nos últimos cinco anos, sempre com a desculpa de que o BNDS precisa participar da obra e com 51% do investimento total tem que ser capital nacional. Um erro inconcebível, no plano estratégico, para um país com um potencial enorme de crescimento como o Brasil, cuja estratégia errada nos trará grandes dificuldades nos próximos anos, até que finalmente, nossas ferrovias estejam prontas e liberadas para circulação de cargas”.

Segundo ele, definitivamente o Brasil, com a situação caótica que vem enfrentado durante a paralisação dos caminhoneiros, não tem margens para erros nos investimentos públicos nos próximos anos, pois precisa estancar a sangria causada pelos erros dos últimos anos e começar a trazer resultados mais concretos para o povo brasileiro.

No entanto, Rafael Barros lembra que para que isto aconteça, tem que se investir fortemente em obras de infraestrutura ferroviária, sejam elas voltadas para o transporte de cargas, assim como para transporte de passageiros e também, por que não dizer, das linhas denominadas de shortlines, com curto deslocamento e potencial de valorização gigante da mercadoria transportada. Assim como ativarmos estudos concretos para a recuperação de nossos portos e hidrovias, fazendo com a nossa matriz de transporte possa ficar um pouco mais equilibrada, como em outros países, gerando desenvolvimento econômico sustentável bem como uma melhor logística intermodal em nosso país.

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Sobre Rafael Barros Pinto de Souza

Coordenador de MBA em Engenharia Ferroviária e do MBA em Engenharia Portuária pelo IPOG, Engenheiro Civil, Especialista em Engenharia Ferroviária e em Infraestrutura de Transporte e Rodovias, palestrante. Possui mais de 16 anos de experiência trabalhando com ferrovias, atuando em construção, manutenção e projetos.